Saiba de onde surgiram as tatuagens, seus significados e porque apagar os traços virou trend
Antes mesmo de simbolizar rebeldia, as tatuagens estavam inteiramente relacionadas à espiritualidade. Enquanto o conservadorismo trabalha para fazer mais uma vítima no mundo da beleza, com ajuda da estética “clean”, são apagados não só os traços de tinta mas também os de personalidade.
Não existe uma demarcação muito precisa sobre o início dessa prática, afinal, ela se desenvolvia de formas diferentes ao redor do globo a cerca de 4000 a 2000 a.C. Além dos materiais, os significados também eram variados.
Na Grécia e Roma Antiga as tatuagens eram utilizadas para marcar prisioneiros de guerra. Para os germânicos e vikings, uma forma de eternizar guerras e cultuar seus deuses. No Japão, surgiu como uma prática espiritual e decorativa, mas também definia status de coragem, em seguida igualmente servindo para a demarcação de criminosos.

Já na China, eram utilizadas para demonstrar prisioneiros a serem exilados, comunidade essa responsável pela criação da técnica cover-up (cobrir uma tatuagem com outra mais elaborada): quando os grupos exilados passaram a cobrir as tatoos de punição com enormes desenhos de animais e seres mitológicos como carpas e elefantes.
Os traços de tinta surgiram com apelo espiritual e social, representando amadurecimento, pertencimento a algum grupo ou registro de momentos importantes, como as famosas tatuagens de marinheiros eternizando suas aventuras pela Ásia e Oceania no século XIX.
Voltando para os anos 2020, as tatuagens continuam detendo simbologias diversas, mas sem perder seu caráter estético decorativo, porém, estão longe de serem incluídas nas tendências de beleza. Você com certeza já se deparou com as estéticas clean e quiet luxury por aí e sabe o que todas têm em comum? Uma pele perfeitamente lisa do rosto aos pés.
Outros conceitos como o old money e suas variações ditaram os caminhos da beleza entre 2024 e parte de 2025 com o chamado quiet beauty, uma ideia de beleza espontânea sem revelar os inúmeros procedimentos estéticos nem os acompanhamentos com médicos endócrinos, nutricionistas, dermatologistas…
O que acontece é que a remoção de tatuagem agora faz parte dos procedimentos desejados, quase como um novo passo na rotina de cuidado. O Brasil, por exemplo, ocupa o segundo lugar no ranking global de demanda por remoção/correção de tatuagens, com uma média de 275 mil casos anuais (levantamento da plataforma Preply).

O custo de cada sessão varia pela casa do milhar de acordo com a tecnologia do laser escolhido. Um exemplo perfeito é o de Pete Davidson que chocou a internet ao aparecer com a pele totalmente uniforme no tom natural em uma campanha da Reformation. O ator revelou ter gasto mais de R$1,1 milhão para remover suas tatuagens em um longo processo.
A remoção de uma tatuagem acontece por meio de várias sessões a laser, levando meses para obter o aspecto uniforme de volta. Um episódio mais recente é o da cantora Anitta, que também aderiu à remoção, levantando, novamente, o debate sobre personalidade e qualidade das tatuagens pelas redes sociais.
“A tinta ultrapassa a epiderme até chegar à derme, o organismo até tenta eliminar essa tinta, mas as partículas são muito grandes. O laser atua justamente na quebra dessas partículas, expulsando-as “, explica a dermatologista Dra. Alice Jaruche em seu portal, onde continua: “No caso da remoção da tatuagem, a luz laser é direcionada para a tinta […] A luz fragmenta essa cor em pedaços muito pequenos, facilitando o processo natural do corpo da remoção da tinta”
Não só na beleza, mas na moda existe um debate (que não é recente) sobre o que queremos comunicar com nossas roupas, maquiagem, cabelo e unhas. Se em séculos passados, tatuagens de povos nativos foram apagadas durante colonizações por serem vistas como uma profanação do corpo humano, por que nos anos 2020 as pessoas vêm buscando apagar suas escolhas? Seria por falta de identidade, início de novos ciclos, mais um padrão de estética inacessível ou a tão comentada volta do conservadorismo?
A tatuadora cuiabana Tanji define a alta busca pela remoção de tatuagens por diversos fatores: “Não só a crise de identidade, o modismo como meio externo interferindo diretamente na escolha do estilo e desenho, como a qualidade inferior que os materiais antigos ofereciam”
Mas será que tatuagem é para todo mundo?
“Existe um ditado que diz: nem tudo que posso, devo. Mas em relação a tatuagem, opino que todos devem e podem. Antigamente, éramos mal vistos (tatuados e tatuadores), pelo preconceito e história que a tatuagem trás. Hoje, quem tem uma tatuagem, não sofre o mesmo preconceito que sofria quando comecei, há 19 anos. Então tenho a opinião que todos podemos tatuar sim. Juízes, advogados, policiais, donas de casa… Imagino no futuro, a maioria das pessoas tatuadas” – responde Tanji.
O que absorvemos disso tudo, é que mais do que traços na pele, as tatuagens revelam escolhas, memórias e vivências únicas. Apagar o que antes foi expressão pode até parecer libertador, mas também nos convida a refletir: estamos nos reconstruindo ou apenas tentando caber em todas as tendências que surgem por aí? Em tempos de padronização estética, talvez a verdadeira revolução esteja justamente em assumir quem somos, com ou sem tinta!

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