O tema do Met Gala 2025 é atemporal em todos os sentidos possíveis. Um tema que visa homenagear a construção da identidade negra na diáspora africana por meio da alfaiataria, é muito mais do que apenas uma noite espetacular. Alguns afirmam que o evento é sinônimo da famosa Capital dos Jogos Vorazes – da excentricidade, das vestimentas chamativas e joias de milhares de dólares -, onde a riqueza é celebrada em prol de algumas horas de festividade. No entanto, a interpretação criativa da alfaiataria desse ano cai como luva no mesmo mês que foi lançado o filme Pecadores, de Ryan Coogler.
Pecadores segue sendo alvo de críticas de enorme valor, mesmo após quase um mês de seu lançamento. Por ser uma experiência cinematográfica, o filme celebra a cultura negra através do Blues, a mitologia presente nas raízes africanas, a ancestralidade e a vestimenta impecável dos irmãos gêmeos Smoke e Stack, que remete à forma elegante e refinada do tema “Superfine – Tailoring Black Style”, inspirado no livro Slaves to Fashion de Monica L. Miller.
Na trama, o cineasta norte-americano conta uma história vampiresca no Mississipi, repleta de camadas metafóricas, para um público pouco acostumado a ver a segregação racial dos Estados Unidos sob a ótica do horror. Por meio de uma alegoria visceral dos preconceitos sofridos pela população negra em uma época que o extermínio era sinônimo de culto para os brancos da Ku Klux Klan, o diretor anuncia uma narrativa de sobrevivência e luta através do “acordo com o diabo”.
Coogler criou um cinema tão único e louvável, que 2h17min não são suficientes para uma análise profunda de todas as nuances descritas durante a realidade daquela América Negra. Ainda assim, ele consegue fazer isso através do figurino do Michael B. Jordan, que se mostrou emblemático ao fazer o papel de dois irmãos gêmeos com personalidades tão distintas, mas que possuíam o mesmo propósito: se fortalecer diante de uma sociedade que queria exterminá-los, mesmo que seja pela música e pelo conceito “dândi negro”.

O dandismo negro foi um movimento estético e identitário, surgido entre ex-escravizados que decidem usar da moda e alta costura como voz ativa em prol da resistência e afirmação social. Sendo um modelo libertário para a população negra, o figurino assinado por Ruth E. Carter, usufrui da mesma semântica para seus personagens gêmeos: ambos identificados pela cor de sua vestimenta, Stack, mais extrovertido e mulherengo, recorre a peças em vermelho e Smoke, o introvertido e minucioso, é pautado por acessórios em azul. Mas ambos utilizam ternos sob medida, chapéus de abas largas e boinas, lenços de bolso e peças com broches.
Na noite do dia 5/05, as celebridades utilizam do conceito de elegância individualizada do dândi com muita criatividade. O ator Bryan Tyree Henry, vestido com Orange Culture, uma marca da Nigéria, com lenços e luvas para adornar o look. Khaby Lame, usou um custoom Boss ornamentado de relógios no colete e com um chapéu de aba larga, tal como Stack no filme. A atriz e cantora Teyana Taylor, vestindo Marc Jacobs personalizado pela mesma figurinista de Pecadores, Ruth, que usufruiu do mesmo corte dos ternos dos irmãos. E até mesmo Rihanna, grávida de seu terceiro filho, utilizou dos mesmos adereços composto no figurino.


O tema que homenageia a interpretação criativa, principalmente focada no vestuário masculino, com ternos e cortes sob medidas, reconfigura códigos de poder historicamente negados. Da mesma forma que Smoke e Stack utilizam da alfaiataria para se fortalecerem diante a segregação racial no Missisipi, o dandismo negro estará presente em todas as telas e vivências, até porque a construção identitária daqueles que lutaram para sobreviver é pautada pelo movimento que preza pela racialização da moda.

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