Em uma passarela montada na Fundação Bienal na noite de ontem (24), a Misci apresentou sua nova coleção como uma Tieta que retorna ao Agreste com malas maiores e com mais maturidade.

 Foto: Divulgação/Zé Takahashi

Inspirada livremente em Tieta do Agreste, a clássica narrativa de Jorge Amado transformada em novela, o Verão de Airon Martin não se apega à literalidade do enredo, mas sim à metáfora da mudança. Como Tieta, a marca aparece amadurecida, com domínio técnico mais apurado e um olhar ainda mais afiado para o Brasil que insiste em representar, mas agora de dentro para fora, e não mais de fora para dentro.

A principal novidade é a inauguração, no final do ano passado, do seu próprio ateliê de costura. Essa mudança permite a produção interna de peças mais complexas e em tiragens menores, refletindo um acabamento mais sofisticado, perceptível especialmente nas peças de alfaiataria masculina.

A alfaiataria, sempre um território seguro para Airon, surge afiada, com cortes alongados e proporções sensuais, sobretudo no masculino. O corte é limpo, geométrico e sensual sem esforço. Há um frescor na proporção, mas não é “oversized”.

 Foto: Divulgação/Zé Takahashi

As colaborações seguem como parte do DNA da marca, com destaque para as estampas do artista visual Elian Almeida. Há uma brasilidade que não precisa se provar, aparecendo mais como linguagem do que como símbolo, apesar das t-shirts com o slogan da coleção. Isso confere à coleção um peso mais elegante, alinhado com o posicionamento de Airon de no mercado internacional.

 Foto: Divulgação/Zé Takahashi

Ainda assim, o feminino parece menos resolvido. Enquanto o masculino avança com precisão, algumas construções femininas tropeçam em excessos. O ponto de equilíbrio aparece em peças mais enxutas, como conjuntos de alfaiataria de cintura baixa e jaquetas de corte quadrado.

O desfile também funcionou como uma declaração de influência. Com uma primeira fila repleta de nomes como Erika Hilton, Seu Jorge e Sasha Meneghel, Airon Martin relembra que a Misci deixou de ser promessa e se tornou presença. E claro, como não citar a passada do designer ao som de Carlos do Complexo, em companhia da eterna Tieta, Betty Faria? Para mim, é no mínimo admirável ver um diretor artístico que, assim como eu, é mato-grossense, ser amplamente celebrado.

Foto: Reprodução/Leca Novo FFW

Misci então se posiciona como uma marca que começou com discurso e agora entrega produto e que, talvez, como Tieta, entenda que se fortalecer é a única forma possível de continuar. A Misci se apresenta, assim, como uma tradução contemporânea de sua potência: naturalmente sexy, brasileira e complexa.

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