Villeneuve sobrepõe seu trabalho anterior com uma sequência hipnotizante.

Em Duna (2021) já havia transparecido o fato de que o árido do cineasta Villeneuve é terreno fértil para a ficção científica. O diretor, famoso por ‘Blade Runner 2049’ e ‘Arrival’, arriscou, não uma única vez, mas duas sequenciais e inebriantes adaptações do livro.

O resultado é uma produção audiovisual ímpar e repleta de elementos cenográficos que transmitem uma atmosfera penetrante, por mais que sua hipnose não seja tão duradoura quanto a profundidade do texto de Frank Herbert.

Na contramão da vagarosidade tediosa do primeiro filme, Dune Part Two se infiltra no tecido epitelial do telespectador: arrepios, sustos e alguns ataques de frenesim são efeitos colaterais da aterrissagem de volta ao fenomenal planeta Arrakis.

Não foi Jodorowsky em 1975 com seu script impossível nem Lynch em 1984 com sua estética grotesca e maximalista quem conseguiu uma execução de Duna impecável. Villeneuve executa com sua equipe essa tarefa com a mais prazerosa das felicidades.

Um projeto que se concretiza praticamente sem críticas negativas e que se difere do primeiro filme pelo seu ritmo mais frenético e pelas 2h45 imperceptíveis de pura ação e diálogos fluidos. Está aí o ingrediente que faltava para Villeneuve conquistar o restante do público, agora o mundo é seu.

Duna se passa em um império totalitário intergalático em expansão, onde feudos planetários são controlados por Casas nobres, em que O Duque Leto, da família Artreides, é designado pelo Imperador para comandar o planeta desértico Arrakis, um local de interesse político pela abundância de uma rara especiaria com fins medicinais e de alto valor econômico.

Sem a especiaria é impossível o deslocamento e o comércio interplanetário. Por ela, há oitenta anos o barão Harkonnen (Stellan Skarsgard) persegue e tenta exterminar os Fremen, a população nativa de Arrakis. Entretanto, a casa Atreides foi dizimada pelos Harkkonen.

Na segunda metade da duologia, Paul Atreides (Timothee Chalamet), o único herdeiro de sua dinastia, se une aos guerreiros Fremen para se vingar de seus inimigos. 

A excelência do filme não se resume apenas ao retorno do espantoso elenco – composto por Chalamet, como Paul Artreides, Zendaya, como a Fremen Chani e por Ferguson, como Lady Jessica Artreides — ou pela cinematografia inigualável e única, desenvolvida por Villeneuve e seu Diretor de Fotografia Greg Fraiser, que foram capazes de transformar imagens subjugadas e monocromáticas vindas de um mundo que é “apenas areia e poeira” em um blockbuster sólido e singular.

Fraser se tornou um dos diretores de fotografia para produções de referência em efeitos visuais, incluindo Rogue One: A Star Wars Story, The Creator, The Batman e a série de TV The Mandalorian. Analógico e digital são sobrepostos como as camadas de um bolo ao longo da produção de Duna, que funde com excelência uma estrondosa trilha sonora e cenários físicos com efeitos CGI em locais reais do deserto (Abu Dhabi e Jordânia) para criar panoramas de pessoas, máquinas, espaço, fogo e mares de areia.

Com uma equipe de competência indubitável, a direção fotográfica consegue reproduzir efeitos gráficos da maneira mais realística possível, justamente com o objetivo de fazer com que a imagem pareça tão visceral que o espectador não pense em como ela foi criada até mais tarde. 

Retorna também a figurinista Jacqueline West com sua estética “mod-eval”, misturando aspectos medievais com a modernidade, e se inspirando em Cristóbal Balenciaga e na alta-costura dos anos 1950. Além disso, a profissional tem um olhar crítico e fértil para a arte medieval, pinturas árabes, o norte da África e o antigo Islã.

Diga-se de passagem, um critério altíssimo na direção de arte é a capacidade do figurino e hairstyling de transmitir a mensagem ou as transições de fase dos personagens durante o longa-metragem, e Duna parte dois cumpre esse requisito com maestria, principalmente no que se refere à personagem de Rebecca Ferguson. 

A complexidade da atmosfera construída por Villeneuve em seus últimos trabalhos há de causar uma ansiedade geral tanto aos nostálgicos fãs de Star Wars que se identificam com o novo mundo quanto à crítica especializada por uma continuação frenética da jornada do herói interpretado por Chalamet.

Duna Messias, o terceiro longa-metragem da saga, já foi confirmado pelo diretor. De acordo com o The Hollywood Reporter, ele está quase terminando o roteiro da terceira parte da saga. Mas muitos desafios aguardam o Messias. Não há dúvidas sobre o praticamente impecável roteiro assinado por Eric Roth, Jon Spaihts e pelo próprio Denis Villeneuve, mas é de se esperar um declínio da apreciação crítica, haja vista a má recepção dos outros livros pelos leitores de Frank Herbert.

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